quarta-feira, 28 de maio de 2008

Os Opostos Tricolores

Como estou com pouco tempo para escrever no blog, estou postando mais dois textos de outros autores. Um é do brilhante jornalista Sidney Garambone, e o outro é de um torcedor são paulino.
Prometo que vou tentar escrever mais. O tempo está curto. Mas eses textos aí embaixo valem muito a pena. Aproveitem.






O ÚLTIMO MINUTO - Sidney Garambone


Ele se chama Flávio Henrique, e não Fernando Henrique. É como eu, você ou nossos amigos mais próximos. Um apaixonado pelos mistérios do futebol. Atravessou a madrugada aos goles e prantos. Feliz e sentindo-se recompensado pela coragem, pela fé em acreditar no irracional, no inimigo de Descartes.Flávio tinha 12 anos quando o pai o levou ao Maracanã. Era decisão, era contra o Flamengo, e o time dele não era o favorito. O empate dava o título ao rubro-negro. E talvez querendo evitar a primeira dor d´alma do filho, o pai de Flávio largou o terrível “vamos embora meu filho”! Foram, já nas rampas do estádio ouviram o urro da turba, era Assis entrando para a história. Voltaram correndo e passaram a noite vibrando.Pouco mais de uma década depois, já sem pai, Flávio estava novamente no Maracanã, novamente numa decisão, novamente contra o Flamengo. O placar resistia amargo para ele. O empate era rubro-negro e o 2 x 2 parecia ser imutável. Lembrou-se do pai, de Assis, do mistério. Resolveu ir embora antes do apito. As mesmas rampas estavam lá. Mas nada aconteceu. Continuou o périplo rumo ao asfalto. De novo o imponderável. Uma barriga entrou para a história. E Flávio voltou correndo para as arquibancadas. Passou a noite vibrando.Quarta-feira, 21 de maio de 2008. Contra o São Paulo lá estava Flávio, mais uma vez acreditando no time dele, que passou 91 minutos sem a classificação assegurada. Um pouco antes disso ele virou para um velho companheiro de cimento e bradou, confiante: vou embora! Pela terceira vez seu coração traía os próprios olhos. Ouviu impropérios de quem o considerou um covarde. Seguiu indiferente rumo ao anel externo. Comprou uma cerveja, sentou no chão e chorou. Um coroa passou e disse: “Vamos, menino, vamos voltar para lá, ainda dá!”. Flávio recusou, lembrou dos quilos de Nelson Rodrigues que já lera, do Gravatinha, do Sobrenatural de Almeida, do homem fatal de Bicas e acreditou naquelas bobagens que só nós, apaixonados por futebol, acreditamos como a mais pia das verdades.Enquanto isso, uma explosão demográfica na área de Rogério Ceni. Mesmo assim, Washington honra um nome já conhecido pelos refletores, sobe mais que a gigantesca zaga são-paulina, pára no ar como um beija-flor e beija com a testa o couro amarelo. A rede dança, o pranto explode e do breu do túnel de acesso, surge mais uma vez Flávio, tresloucado, rouco e feliz. Com a absoluta certeza de que tudo foi culpa sua.



ÉPICOS - Ricardo Perrone


"Olha, eu estou aqui no Maracanã. Acabei de ver o meu Tricolor perder para o outro Tricolor, estou obviamente triste e não quero escrever nada agora. Só quero registrar que vi um jogo épico, um time que vai ficar pra história por esta simples classificação, contra outro time de altíssimo nível que perdeu pro futebol, pro acaso, pra competência, pro matador, pro Renato ousado e pra uma torcida que, confesso, me deixou muito impressionado. Não pelo número, mas pela fé. Eu nunca vou esquecer o que vi aqui. Nem pelo choro que não contive no final do jogo, quando vi alguns dos caras que eu vejo treinar todo dia sentandos no gramado, e quando entrei na cabine para colocar a manchete na Estação Tricolor. Pior: Eu vi o último gol dentro da torcida do Flu, porque fui fumar.E o que era pra ser mais dolorido se tornou um anestesico. Eu senti ali dentro a emoção e a alegria deles, e, juro por Deus, me dói dizer isso, mas eles mereciam. Como torcedor saio daqui frustrado, magoado, arrasado. Não vou dormir, tenho certeza. Pra se ter idéia do quanto doeu pro time, eu to online com o Alex Silva e ele me conta que 80% do time tá acordado, pensando, mudo. Ele me disse a seguinte frase: "Foi o pior dia da minha vida". Da minha não foi, porque conheci um Maracanã que eu nem sonhava ser tão lindo. Entrei no gramado, vi ídolos… enfim, coisa de apaixonado por futebol. Mas, caros tricolores…Parabéns pra alguns, e calma pra outros.O mundo não acaba por uma derrota. Mas também não gira se continuarem com a tese do "perdemos pra nós mesmos".Hoje não! Perdemos, mas perdemos pra um Fluminense forte, guerreiro e que mereceu passar de fase.Ninguém faz 3 gols no São Paulo. E quando faz, merece passar."



Não quero dizer que concordo com o que está escrito, ou discordo das opiniões. São ótimos exemplares de como razão e paixão se confundem. O futebol é cultura, assim como a literatura. Os dois juntos são arte. E que arte.